Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto de mundo, devo usar toda a possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas participar de práticas com ela coerentes.

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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

O professor posto à prova


Principal instrumento de aferição na escola, avaliação escrita ainda é pouco entendida por docentes brasileiros; falta de debate sobre resultados compromete processo de ensino e aprendizagem.

A prova de Geografia começa e logo o aluno de ensino fundamental se depara com a seguinte questão: "o que é depressão?". A resposta vem imediata e constrange o professor: "é aquela doença que minha mãe tem e precisa tomar remédio". Em outra escola, o docente chega com o maço de provas. Começa a chamar os alunos para receber as notas, com um detalhe: a chamada acontece em ordem decrescente de desempenho, o que instaura uma espécie de terror na sala de aula.

Ambas as situações são reais e estão descritas no estudo Prova: um instrumento avaliativo a serviço da regulação do ensino e da aprendizagem, realizado pela pesquisadora Dirce Aparecida Foletto de Moraes, da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Os casos, que não são isolados, mostram como permanece profundo o abismo entre a teoria e as práticas da avaliação. Além disso, indicam que a prova escrita, principal recurso do qual o professor lança mão para se informar sobre o desempenho dos seus alunos, frequentemente é elaborada sem os pré-requisitos necessários para se configurar como um bom instrumento de avaliação.

O estudo foi publicado na última edição da revista científica Estudos em Avaliação Educacional, da Fundação Carlos Chagas, e joga luzes sobre um tema relativamente pouco estudado na academia e insuficientemente trabalhado nos programas de pedagogia e de formação continuada. Afinal, se é verdade que a avaliação é um componente essencial no processo de ensino e aprendizagem, e se o professor tem na prova seu instrumento mais rotineiro, torna-se urgente aprimorar o uso desse recurso, tanto na compreensão mais ampla do que ele representa, como na própria elaboração do instrumento.

Não que não haja interesse. O matemático Tadeu da Ponte, diretor do instituto de avaliação Primeira Escolha, responsável, entre outros, pelo vestibular do Ibmec, vem realizando palestras em todo o país sobre o tema da prova, sempre para auditórios lotados. "É preciso lembrar que esta não é mesmo uma questão simples, e o professor precisa ser preparado para saber avaliar", diz.

Perspectiva histórica

O primeiro passo é, exatamente, compreender o princípio do que se está fazendo. Afinal, o que é uma prova? Ela é mesmo um bom instrumento? Por que se tornou um sinônimo de avaliação? Segundo o autor Cipriano Luckesi, uma das referências no tema no Brasil, a prova surgiu ainda no século 16, na Europa, como um recurso de coleta de dados sobre o desempenho do educando. "Esse recurso recebeu o nome de ''''prova'''' e permaneceu com essa denominação até hoje. É o mais comum e cotidiano instrumento usado em sala de aula", diz Luckesi. Boa parte de seu sucesso se explica pela eficácia de reunir informações sobre um conjunto grande de alunos. Na Idade Média, não havia necessidade de testes escritos, devido a pouco número de aprendizes. "O mestre convivia diretamente com todos, podia observá-los, conversar, observar diretamente seu desempenho", lembra. Mas veio o tempo em que se tornou necessário o ensino para muitos e a demanda por um recurso eficiente para que o professor pudesse conhecer o desempenho de todos - e assim nasceu a prova.

Para a pesquisadora Dirce de Moraes, há outros fatores que fizeram com que o teste se tornasse um instrumento predominante ao longo dos séculos. Ele documenta e comprova o conhecimento, possibilitando a representação final por um valor numérico, que retrataria a aprendizagem daquele que foi avaliado. Para Dirce, hoje muitos professores simplesmente não conseguem acompanhar a aprendizagem do aluno sem lançar mão da prova. "Os educadores até buscam novos caminhos, mas, por desconhecerem as diferentes ferramentas ou por sentirem-se inseguros, garantem-se na prova como instrumento comprobatório", diz.


Críticas

A prova também se tornou um meio de comunicação entre famílias, crianças e escola. Basta ver que é muito mais frequente um pai perguntar a um filho ''''como foi na prova'''', do que ''''o que você aprendeu''''. Provavelmente, o abandono dos testes escritos causaria um terremoto na confiança que as famílias depositam na escola. Por fim, diz a pesquisadora, até mesmo entre os alunos a prova se tornou um instrumento de status, induzindo uma hierarquia em sala de aula. "A nota da prova leva a distinções entre melhores e piores, entre aqueles que têm potencial e os que seguem para o fracasso", diz. Nesse sentido, práticas docentes como dar a nota em voz alta estimulam essa visão.

Mas essa é apenas uma das críticas direcionadas à avaliação. Uma delas diz respeito aos usos inadequados dos instrumentos, especialmente por seu caráter de controle da classe e de poder do professor sobre o aluno. Outro questionamento é a confusão entre avaliar e fazer prova. "A prova em si não avalia nada, só oferece subsídios para o professor analisar as aprendizagens dos alunos", diz Dirce. "Avaliar é tudo o que acontece antes da nota", reforça Luckesi. Mas, tudo isso não significa que a prova seja um mal em si, alertam os pesquisadores. A questão é que ela precisa ser adequadamente aplicada. A começar do mais óbvio: uma prova escrita é útil quando se restringir às competências lógico-verbais. Ou seja, pode-se fazer uma prova escrita sobre história da arte, mas não sobre as habilidades de um artista. Por isso mesmo, há diversas outras situações na vida escolar que requerem outros instrumentos de avaliação - como produções, portfólios, apresentações e outras formas de levantar informações sobre a aprendizagem.

Uma boa prova

Veja algumas dicas de como elaborar a avaliação escrita em sala de aula, segundo diferentes autores:

1. Ter clareza do objetivo de cada pergunta. É preciso haver intencionalidade.

2. Buscar que sejam adequadas ao nível dos alunos, com questões bem distribuídas, entre fáceis, médias e difíceis.

3. Elaborar as questões com perguntas que sejam relevantes e evitar pegadinhas. Tem de ter um tema predominante. Evitar os extremos: nem tão geral, nem tão específico, pedindo "a nota de rodapé".

4. Se possível, buscar contextualizar os problemas ou, pelo menos, procurar apresentá-los de forma a provocar o raciocínio e evitar somente respostas memorizadas.

5. Ser rigoroso com a linguagem, evitando perguntas genéricas. O comando, ou seja, o que se quer de cada resposta deve estar muito claro. Evitar o uso de questões com o uso de negativa, que posteriormente prejudicam a análise da prova.
6. Ser coerente com as aulas e as estratégias previamente utilizadas nas aulas.

7. Evitar provas exaustivas, que demandam muito tempo de realização. Isso não contribui para a qualidade do instrumento.

8. Planejar a prova com antecedência, com tempo para reler as questões, refazê-las e depurá-las.

9. A escolha do formato deve estar a serviço do objetivo. Questões de múltipla escolha podem ser tão boas com quatro opções do que de cinco, por exemplo. Para o Ensino Fundamental I, é melhor utilizar três alternativas; para o Ensino Fundamental II, quatro.

10. Atenção aos detalhes: cuidado com a correção gramatical, e com o uso de gráficos com cores e tamanhos que depois podem ser prejudicados na reprodução.

Paulo de Camargo

Reportagem retirada do site http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/174/o-professor-posto-a-prova-236301-1.asp . Acesse para ler na íntegra.